Sunday, November 05, 2006

Palavras de Cotrim

A conversa.

Se existe um reduto da espiritualidade humana, acreditamos que ele reside na conversa.
A conversa é um interlúdio que se tem, do qual se usufrui, havendo, inclusivé, quem muita conversa. A conversa é, portanto, também um bem que se troca. Nada de mais expectável, em tempo histórico de mercadorização da experiência humana. Neste contexto, há quem advoge as propriedades terapêuticas de uma narrativa, de um transacção dialógica, de uma recomposição do nexo e do significado de uma vivência pessoal.
E há também quem inverta o sentido primordial do conceito, desconversando.
Mais de meio século depois da publicação de Le viol des foules par la propagande politique, Tchakhotine é parte relevante do inconsciente constituinte de uma certa cultura de comunicação reificada no torrão nacional.
A desconversa é equipamento fundamental, ao que parece, dos novos gladiadores da comunicação de consumo rápido: mais do que discutir a substância das ideias do adversário, deve partir-se, com urgência, para a sua desconsideração, tentando, deste modo, a sua menorização e desautorização. O império do fait-divers adquire aqui, novo cabimento aparentemente impoluto.
Como advoga Stephen Miller, na publicação recente "Conversation - History of a declining art", a conversa e o seu bom intérprete definem uma arte e um ofício em declínio. Como o autor formula, "in popular culture rude people are celebrated as authentic, and those skilled at the art of conversation are often depicted as superficial or effeminate or dishonest (or all three)."

Não sabendo, no momento presente, qual o lugar concreto de celebração, manifestação e residência da autenticidade, continuamos, contudo, a tentar retirar uma gratificação quase ilimitada de um bom momento de conversa.

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