De uma consolada consoada, brado de mil consoantes mui sonantes após a cevada (parte I).
A noite de consoada é, por tradição de alguns, momento de reunião em casulos privativos, e actualização de memórias, rituais, e diversas luminárias, pela qual as gentes assim dispostas, fazem a si mesmas o favor de se supor um pouco mais felizes. Deveria ser este o ponto de encontro com aqueles que nos apoiam, por serem do mesmo tamanho que nós, e estarem treinados no nosso passo de saltadores de valas inundadas.
Contudo, muito deste intuito fica diluído, por entre diálogos fortuitos e circunstanciais que se estabelecem entre pessoas que já não se veêm há muito tempo, e que não se querem ver, a partir daí, por outro tanto tempo. Propondo colmatar esta insuficência, apresentamos a figura de Jesus como possível tema de dinamização de conversas de consoada pós-cevada, remetendo-as para um universo de significado pouco consensual: Jesus como arquétipo sexual.
Na sua obra Christs, David Miller (1981) explora as imagens mentais da videira, do vinho e da embriaguez em várias tradições religiosas, e insiste em ver algo de dionisíaco em Jesus. O espírito do deus grego Dioniso - que representa uma vida não dividida entre prazer e princípio, alegria e pobreza emocional - costuma ser visto como uma força sexualmente expansiva e, por isso, não é óbvio na maioria das imagens de Jesus.
O Jesus dos Evangelhos é amigo, emotivo, fisicamente expressivo e até sensual. Numa ocasião, através de um milagre, permite que a celebração de um casamento tenha vinho suficiente. Noutro momento, dá ao povo, pães e peixes, para que cuidem do seu almoço. O seu toque é curativo. Rosemary Ruether (1978), no texto "The sexuality of Jesus", estende a imagem sexualizada de Jesus: "Ele senta-se à mesa com pecadores. A mulher pecadora, uma prostituta, é apresentada aos fariseus como um modelo de amor e arrependimento... Jesus vive em cidades e nas casas de amigos. Não jejua, mas come e bebe (não sumo de uva)..."
O discurso prossegue após a cevada.
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