Thursday, August 09, 2018

It`s an outlier!

Coimbra, agosto de 2018, agosto de 1998.



Sentados, os doutores, infatigáveis arroteadores da tradição admirável, falam, subtis, melosos, das suas prateleiras, das suas memórias, dos seus envoltórios de coiro. 

Dialéticos de verbo irrefutável, as suas histórias começam, quase sempre, umas centenas de metros antes das suas casas. É o que melhor conhecem.

Já lhes levaram as madeiras, as telhas, a cantaria mais delicada, mas anda ainda por ali uma aragem, uma pretensão de nobreza antiga. Os doutores subtis persistem, esticam o pescoço, cobiçam os mais pequenos motivos para uns quantos foguetes. No seu rescendor aristocrático, empenham os lugares, os acontecimentos, preparam a sua aptidão para a reprodução do vão alto do templo.

Muitos deles têm uma égua preta, que os leva pelas redondezas às missas de corpo presente. Nestas solenidades, há um quórum invariante imprescindível. Nestas solenidades, a pompa do verbo oculta o tártaro, o desenrolar dos vértices na memória, nos alvéolos.

A novidade (a diferença) é, para os doutores, motivo de contencioso. Perturba a paz acomodatícia, esquenta o forno do povo, é contrária à sorte que o recordatório oficial relembra. A novidade (a diferença), se forjada em oficina alheia, reveste-se de agravos especiais: nestes casos, os doutores levam uma mão ao aparelho, pegam num rosário de dentes de alho, agitam-no um pouco. Depois acontecem coisas, subtilezas, impedimentos que são ditos naturais.

Hoje à volta dos cinquenta, dos sessenta, dos setenta, os doutores têm o seu pecúlio assegurado. Velhos homens e mulheres de província, herdeiros subtilmente conduzidos à sua herança, imploram ainda assim por quem os louve. Mandam vir machados, para que o futuro se mantenha próximo.

Hoje, como ontem, os doutores conhecem as dobras do terreno onde os confrades se juntam para receber hortaliças. Hoje, como ontem, isso é-lhes suficiente.

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