Raul.
Às duas da tarde, o senhor raul vai todos os dias ao café. Pede um galão e depois adormece.
Ontem, sem explicação particular, o senhor raul não adormeceu.
Quando pediu o galão, o senhor raul tirou da carteira um papelinho, amarelo, puído, que olhou cuidadosamente com o coração cediço na boca.
Parecia tratar-se de um velho bilhete postal, uma reminiscência efervescente dos tempos do ultramar, uma lembrança, talvez, de conquistas antigas.
Com esforço, o senhor raul levantou-se e pediu-me ajuda, para decifrar no papelinho umas quantas letras já sumidas. Vinte e um mil euros, disse-lhe, baixinho.
O papelinho estimado era, afinal, um talão, ínfimo, de um multibanco. O balanço, talvez, de uma vida. Sentei-me. Ocorreu-me a minha velhice, de que morrerei tanto.
O senhor raul vive sozinho há oito anos.
Noutros tempos, teve sonhos, sobremesas, destinos previsíveis.
Hoje, sente-se feliz por ainda conseguir ver o padre na missa.
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