Em Portugal, muitos filhos são primos.
Em Portugal, muitos filhos são primos. E depois há cunhados e genros e noras e mais primos.
Em Portugal, tende a distribuir-se a riqueza e a pobreza existente, não em torno e em função de acordos, de contratos ou de princípios de exemplaridade, mas de contextos, de relações, de posições, de afinidades instituídas pela norma, pela tradição, pela obrigação formal.
Trata-se de uma economia de relações com um toque de minifúndio, que incentiva a reprodução do localismo, o enviesamento das decisões em benefício da ordem existente, uma disposição que constitui uma dificuldade à valorização da abertura, da diferença.
A diferença irrompe, desde logo, como ameaça à integridade do contexto, das relações existentes.
As práticas de gestão são medíocres, a sua eficiência é duvidosa, diz-se. Em parte, esta circunstância poderá decorrer, pode propôr-se, do seu foco tomar como objecto primeiro de atenção um contexto de relações e de posições, a necessidade de articular (também) a sua subsistência.
O fulcro organizador das práticas de gestão não é, em termos substantivos, o contrato, isto é, um objectivo reconhecido como hipótese de valor partilhado, uma distinção baseada em recompensas e em incentivos diferenciais, mas sim uma gestalt de relações pré-existente, a necessidade de assegurar a sua preservação, o reforço de relações de civilidade e proximidade existentes, a selecção que tem lugar no contexto de uma confraria de apaniguados.
Este é um quadro que dificulta a afirmação de uma capacidade de julgamento independente, a abertura à mudança, à diferença, a relações de cooperação. Os cálculos de utilidade que se registam são outros: mais terras indivisas, menos encargos de dote, um reforço de banhos entre os dedos dos pés.
O que depois sucede é uma espuma: deixa de haver assunto, deixa de haver compromisso, deixa de haver sangue. Há menos esperança, menos filhos. Emigra-se.
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