Tuesday, November 29, 2016

Self-disclosure.

Uma grande razão (I).


(no dia seguinte ao teu nascimento, dormia já a Eduarda de bandolete, pareceu-me apropriado ir correr até ao alto do bom jesus. para ver o que de lá se via. eram dez da noite. estavam doze graus. seriam dez quilómetros. uma aflição de névoa.

no início, levava - já o sabia - o corpo o miolo o juízo, moídos. quando começou o pináculo da subida, passaram por mim oito ciclistas, que disseram para eu ir, para eu ir, que aquilo não era nada.

eu fui (eu e a dúvida). comecei a sentir, pouco tempo depois, o sangue solto, domando ténue a língua do pensamento. o corpo o miolo o juízo, moídos, afinal não eram nada.
comecei a sentir, depois, um conforto distendido, uma vontade de dar boleias, apertos de mão, abraços.

pensei, por momentos, no teu futuro. o escuro circundante parecia assinalar um segredo, uma distância - reverente, episcopal.

o caminho que mais importa fica quase sempre longe. no caminho, sobra, quase sempre, um resto, a mesquinhez do (pouco) que é dito como possível. o corpo o miolo o juízo, moídos, afinal, não eram mesmo nada.

na escadaria final, comecei a ver coisas. coisas que não sabia.

a presença activa, erradia, do espírito. o favor do silêncio inoperante.
uma senhora roliça, um senhor careca, a dar beijos em francês, atrás de uma capelinha).

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